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segunda-feira, 8 de junho de 2020

Sobre o racismo e como quebrar paradigmas com educação e amor



Após a abolição da escravatura, a liberdade não significou igualdade. Sou branca e nunca tinha sofrido racismo, sempre procurei estudar para entender e ir além, lutar e fazer a diferença. Me apaixonei e casei por um preto e africano. O “e” é importante, pois soma, para o positivo e; também negativo, quando falamos ou escancaramos os preconceitos. 

Desse amor nasceu a linda Cecília Milagros, e antes mesmo dela nascer eu já tinha sentido e sofrido o racismo...Olhares, encaradas. Passei a reconhecer os seguranças das lojas, bancos, farmácias que para mim antes eram invisíveis, mas com meu marido ao lado, eles brotavam do chão. Cecília Milagros nasceu, e não só o amor materno aflorou, mas todos os medos que um dia nunca pensei que sentiria. Ela não era branca e o mundo não estava preparado para Ela. Não tive pânico, e sim muito amor como guia, e num átimo pensei: “Se o mundo não está preparado para Cecília Milagros, ela sim estará preparada para o mundo, e sua base será o amor” (Ao pensar isso JAMAIS IMAGINEI quantos pretos fossem morrer ao longo desses 5 anos, e de formas tão truculentas, hipócritas, cruéis, bárbaras). 

Não existem bons ou maus racismos- todo tipo de racismo é ruim – é preciso pensar nas especificidades da história que faz da desigualdade uma etiqueta internalizada e da discriminação um espaço não formalizado. 

Podemos achar que não somos racistas, mas um fenômeno do cérebro chamado “viés inconsciente” ou “viés cognitivo” (termo mais utilizado por neurocientistas) ou, preconceito implícito, é o que faz as pessoas disseminarem o racismo sem perceber. 

O viés inconsciente é um conjunto de estereótipos sociais, sutis e acidentais que todas as pessoas mantêm sobre diferentes grupos de pessoas. 

É o olhar automático para responder a situações e contextos para os quais você é treinado culturalmente, como uma programação do cérebro. Então se você tem um cérebro, tem viés inconsciente! E o racismo que imaginamos não é simplesmente o que vemos. 

Ele se reproduz também no invisível, no cotidiano, no que se faz e não se percebe, no viés inconsciente. Depois da abolição, o estado sofisticou mecanismos de exclusão, o que vivenciamos até hoje, e o pior aceitamos! E é por isso, que hoje resolvi escrever pois, o racismo se reproduz nessa estrutura de privilégios porque é dentro dela que o preconceito de cor exerce seu poder, criando obstáculos, por vezes ultrapassáveis, infelizmente. 

Mamie Phipps Clark em 1939 entregou sua dissertação de mestrado, intitulada “O desenvolvimento da consciência em crianças negras de idade pré-escolar” (alguns anos depois, ela se tornaria a primeira mulher negra a obter um doutorado em psicologia na Universidade Columbia). Depois, expandiu esse trabalho com experimentos mais sofisticados ao longo da década de 1940, que até os dias de hoje é reproduzido, e hoje realizamos com nossa filha Cecília Milagros.Clique aqui

O racismo do experimento mostra como o viés inconsciente é “ensinado” e “assimilado” mesmo antes de as crianças criarem juízo crítico sobre aspectos da vida e da sociedade, ou seja, antes mesmo de adquirirem a autonomia. 

VOCÊS QUE DIZEM QUE NÃO SÃO RACISTAS já pararam para pensar o que acontece com essas meninas(os) que crescem se identificando com “a boneca mais feia”? São excluídas, oportunidades são tiradas, angústias constantes e uma vida de autoproteção e autodefesa contínua, por medo. 

Os pretos têm medo, pelo simples fato de serem pretos. Eu tenho medo, medo de um dia Cecília Milagros sofrer racismo. Eu tenho medo! E tenho além do medo angústias por tantas vezes meu marido ter sofrido racismo, e nojo por todos meus amigos pretos que sofreram racismo. 

A formação da mentalidade das pessoas se dá com o que elas vêem, ouvem , sentem. VOCÊ QUE ESTÁ ME LENDO PODE DIZER QUE NÃO É RACISTA, NEM EM PENSAMENTO? Hoje eu sou antirracista, e para ser, falar e escrever isso eu tive que sentir o racismo (e cabe dizer que eu já me dizia não racista), não em mim, mas nas pessoas que mais amo nesse mundo! Lutem, façam a diferença! 

Ensinem seus filhos todos os dias que eles podem ser seres humanos melhores! Fazer a vida valer a pena e lutar por dias melhores não só para mim, meu marido ou filha, mas para todos! Mais vidas! 

Mais Amor!O segredo de tudo é a educação com amor, respeito e comprometimento! 

E para terminar além do medo, tenho orgulho, muito orgulho de Cecília Milagros, do meu marido e orgulho de ser antirracista! Vamos à luta, mindelevelmente! 

Dessa forma deixo Mandela: “Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele ou por sua origem, ou sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender. 

E se podem aprender a odiar, podem ser ensinadas a amar, pois o amor chega mais naturalmente ao coração humano do que o seu oposto. A bondade humana é uma chama que pode ser oculta, jamais extinta.” 

Priscilla Lundstedt Rocha - 07/06/2020